Lançado comercialmente no passado mês de maio, o sistema de climatização Senergy Force da AT Solar consegue uma poupança de até 90% no consumo energético relacionado com estas funções. Augusto Teixeira, responsável pelo projeto, partilhou com a Smart Planet o que levou ao desenvolvimento desta solução e as mais-valias que trará para o setor energético
A empresa nacional AT Solar, em parceria com a Universidade de Aveiro, apresentou na Feira Tektónica, em maio, a solução de climatização Senergy Force. Esta consiste num sistema inteligente de climatização que, com recurso à energia solar, aquece água, ventila e climatiza edifícios com um nível de autonomia e poupança de energia térmica à volta de 90%, muito acima das soluções convencionais de painéis solares disponíveis no mercado. Em entrevista com a Smart Planet, Augusto Teixeira, COO da AT Solar e responsável pelo projeto, explica o funcionamento desta solução, a história por detrás do seu desenvolvimento e o que faz dela uma inovação no setor energético
Smart Planet - Em que consiste o sistema Senergy Force? Augusto Teixeira - O Senergy Force é uma solução de climatização desenvolvida em conjunto com a Universidade de Aveiro num projeto que começou com incentivos comunitários em 2013 e terminou em 2016. No total, teve um investimento global de 800 mil euros e tem de momento a patente em processo de registo. A solução consiste em substituir parte das paredes de um edifício por fachadas energéticas, um tipo de módulo solar que capta a energia do sol e a converte em energia térmica. Esta poderá depois ser aproveitada para diversas aplicações no interior da casa, maioritariamente água quente sanitária e aquecimento do espaço, que representam um consumo bastante elevado de energia. Estamos também a trabalhar em poder vir a fazer o arrefecimento das casas de forma passiva, ao aproveitar o efeito de chaminé criado na fachada energética. O que vai fazer é criar uma baixa de pressão, que vai então ser compensada por uma captação geotérmica que arrefece e entra dentro de casa. Em resumo, o Senergy Force é um sistema de climatização passiva altamente eficiente que aproveita ao máximo tudo o que o universo nos dá para climatizar as nossas casas. Aproveita as propriedades físicas do ar para promover a ventilação passiva e simultaneamente assegurar a qualidade do ar do edifício. Assegura que, mesmo com muito calor, não exista excesso de calor na fachada, o que é algo que acontece em muitos sistemas, porque tem a capacidade de se auto-arrefecer ao aproveitar o efeito de chaminé. Por outro lado, distingue-se ainda pela componente de gestão. Desenvolvemos um sistema de gestão técnica centralizado, um pequeno computador que faz a gestão de todo esse processo. Sabe quando a temperatura no exterior é confortável para o interior da casa, quando é necessário usar a captação geotérmica ou quando está calor de mais na fachada e em função disto vai ativar os mecanismos necessários. Tudo isto é feito de forma automática e altamente inteligente. Adicionalmente, o Senergy Force desempenha uma função fundamental para que as casas possam depender menos de fontes de energia não renováveis, que é uma bateria térmica. A energia solar não está sempre disponível, mas a climatização é necessária em qualquer altura. O que esta solução faz é que, quando a energia solar está disponível, acumula o máximo de energia disponível sob a forma de energia térmica para usar depois. Tudo isto é gerido pelo administrador da casa, que determina a temperatura máxima e mínima admissível. Ao fazer isso, quando a energia gratuita do sol está disponível, o sistema carrega a casa termicamente enquanto esta está dentro do intervalo de temperatura admissível. Quando já não há energia térmica disponível para climatizar a casa, é então ligado um sistema de apoio, como uma bomba de calor, mas só o vai ligar a uma temperatura crítica mínima admissível. O que isto significa é que, estando o interior da casa entre, por exemplo, os 20 e os 26 graus, o sistema fica a acumular energia do sol e fica como uma bateria carregada. Normalmente, se as casas forem bem isoladas, esta carga pode chegar a cinco ou seis dias sem que a temperatura da casa baixe.
Como é que surgiu esta ideia? Qual foi o processo de desenvolvimento desta solução? A ideia para o Senergy Force adveio da minha sensibilidade para o tema da sustentabilidade e da experiência que tenho no domínio da energia e climatização. Foi a junção destes fatores que me levou a querer desenvolver algo que fosse verdadeiramente revolucionária e, sobretudo, que constituísse uma alteração radical do atual paradigma da climatização e energia, que é uma necessidade urgentíssima.
O Senergy Force já está comercialmente disponível? Já foi implementado em algum edifício? A solução já foi lançada comercialmente e foi testada no edifício do Centro Português de Sustentabilidade, em Viseu. Este foi o primeiro protótipo em escala real, que está a funcionar desde 2016 – nessa altura com uma autonomia de cerca de 88% e agora perto dos 98%. Mas na altura não era uma solução que fosse comercializável, só já estava validada em termos técnicos; em termos de rentabilidade era muito boa, mas enquanto solução não estava pronta para ser vendida. A solução que estamos a comercializar está pronta para o mercado; neste momento estou a assistir na construção da primeira casa projetada especificamente para integrar esta fachada energética.
Esta solução pode ser implementada em edifícios de qualquer dimensão, ou existe um espetro de dimensões no qual é mais eficiente? Como é modelar, pode ser implementada em qualquer tipo de edifício. Pode ser necessário separar o sistema por zonas, mas a solução está preparada para trabalhar em qualquer tipo de edifício. A área ideal depende muito da região; a métrica que usamos em Portugal varia entre os 10% e 20% da área habitada. Ou seja, se tivemos uma casa de 200 metros quadrados, vamos precisar de entre 20 e 40 metros quadrados de fachada para obter 90% de autonomia.
Para além da poupança que traz aos proprietários, que outras mais-valias é que o Senergy Force poderá trazer em termos de sustentabilidade? As casas e edifícios correspondem a 40% de todo do consumo energético; curiosamente, é também a área com a pior gestão deste consumo. Ou seja, enquanto em alguns casos a eficiência é muito alta, do lado das casas isto não se verifica e, como são em muitos casos pequenas e isoladas, as instalações não são tão eficientemente geridas. Destes 40%, cerca de 85% corresponde a energia térmica, e destes 85% conseguimos uma poupança de aproximadamente 90%. Se equipássemos todas as casa na Europa com este sistema, conseguiríamos o dobro dos objetivos estabelecidos no acordo de Kioto.
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