ENERGIAS
Recorde de 80,4% na produção de eletricidade renovável

Recorde de 80,4% na produção de eletricidade renovável

A APREN estima que esta redução se traduz num decréscimo de 3,6 milhões de toneladas de CO2 em 2023, para 1,82 milhões de toneladas em 2024

Em 2024, a produção de eletricidade aumentou 3,3% face ao ano passado; a produção de eletricidade a partir de fontes renováveis cresceu também, em 10,8%, atingindo o recorde de 80,4% no acumulado do ano, e a capacidade renovável instalada aumentou 8% face ao total instalado em final de 2023 – destes, cerca de 86% dizem respeito a capacidade renovável solar fotovoltaica;

·O ano fica marcado, a nível europeu, pela reforma significativa do mercado de eletricidade europeu, destacando-se a promoção de contratos de longa duração (Power Purchase Agreements (PPAs) e os Contratos por Diferença (CfDs), apoio à flexibilidade não fóssil, produtos para a redução de picos de consumo, promoção dos mercados a prazo e a intervenção pública em crises de preços anormalmente ascendentes;

Já a nível nacional, foi aprovada a revisão do Plano Nacional de Energia e Clima (PNEC 2030), com metas mais ambiciosas: 43,2 GW de capacidade renovável instalada até 2030, mais do dobro da que existe atualmente.

 

O desempenho da eletricidade renovável em 2024:

Em suma, a totalidade dos centros electroprodutores a operar em Portugal Continental produziram, em 2024, um total de 45 637 GWh de eletricidade, proveniente em 80,4% de fonte renovável. A produção renovável cresce, assim, 10,8 pontos percentuais face a 2023, confirmando um novo recorde de geração elétrica renovável nacional. No que respeita ao abastecimento do consumo, a componente renovável contribuiu com 71,5%, confirmando-se o progresso relativo à meta de 93% do PNEC 2030.

Este total foi maioritariamente suportado por três tecnologias: a hídrica, cujo contributo somou 31,9%, sendo esta percentagem correspondente a um novo máximo absoluto nos últimos cinco anos (14 542 GWh); a eólica, que adicionou 31,0% ao total de produção renovável; e pelo solar fotovoltaico, cujo contributo totalizou 10,7% do total produzido, também um recorde (4 898 GWh).

A produção de eletricidade a partir de combustíveis fósseis apresentou uma redução de 49% face ao total de eletricidade do ano 2023, devido ao aumento significativo na produção hídrica, de 5,2 p.p., mas também do eólico e do solar (com incrementos de 1,7% e 2,5%, respetivamente). Estes números resultam da entrada em operação de novas centrais – correspondentes a aumento de 8%  (1509 MW), dos quais 86% são solar fotovoltaico –, bem como da significativa variação negativa de produção de eletricidade a partir de  combustíveis fósseis, estando em especial destaque a redução em 10,7 p.p. da produção através de gás natural.

Relativamente às trocas internacionais, comparativamente a 2023, registou-se uma estagnação do saldo importador, com uma variação de 2%, de 10 218 GWh em 2023 para 10 442 GWh.  Já a produtibilidade elétrica renovável foi bastante elevada, tendo-se registado 1 867 horas não consecutivas, nas quais o consumo foi totalmente suprido por centros electroprodutores renováveis. Este facto resultou de uma acentuada produtibilidade hidroelétrica, eólica e solar, demonstrando-se, assim, qualidade do efeito de portfolio de tecnologias em Portugal, e a elevada resiliência do sistema elétrico nacional face a elevados níveis de integração renovável.

Relativamente às emissões de gases de efeito de estufa (GEE) do sistema electroprodutor, a APREN estima uma redução na ordem dos 50% face a 2023. Em termos absolutos, esta redução traduz-se num decréscimo de 3,6 milhões de toneladas de CO2 em 2023, para 1,82 milhões de toneladas em 2024. A contribuir para esta significativa redução de emissões do sistema electroprodutor nacional destaca-se, por um lado, o incremento de 18,8 p.p. de incorporação renovável (de 69,6% em 2023, para 80,4% em 2024) e, consequentemente, a redução em 11,5 p.p. da incorporação de eletricidade produzida a partir de combustíveis fósseis (de 22,7% em 2023, para 11,2% em 2024).

Estes importantes marcos do setor renovável em 2024 resultaram em inúmeros benefícios para a sociedade, economia e ambiente, dos quais se destacam:

  • 11,7 Mt de emissões de CO2eq evitadas;
  • Uma poupança em importações de combustíveis fósseis de 2 055 M€;
  • Uma poupança em importações de eletricidade de 289 M€;
  • Uma poupança em licenças de emissão de CO2 de 715 M€, reflexo do preço médio anual das licenças de 65,1 €/tCO2.
  • Poupanças na componente de energia da tarifa de eletricidade inerentes ao efeito da ordem de mérito num montante que ascende a cerca de 8,84 mil milhões de euros.

 

As novidades legislativas no setor em 2024

Em termos legislativos, a União Europeia (UE) reforçou várias medidas com o intuito de tornar a energia acessível às famílias e às empresas e garantir o acesso a fontes de energia limpas seguras e diversificadas.

Estas visaram também o reforço da competitividade da UE no setor energético, permitindo à Europa aumentar o compromisso com a descarbonização da sua economia e diminuir as dependências energéticas externas, confirmando, desse modo, a ambição desta ser pioneira na neutralidade carbónica até 2050 e simultaneamente aumentar o nível da sua independência energética.

  • Regulamento (UE) 2024/1252 (abril): pretende garantir um aprovisionamento seguro e sustentável de matérias-primas críticas, indispensáveis à economia da UE e de um conjunto de tecnologias necessárias para setores estratégicos, como as energias renováveis. O objetivo é assegurar que a Europa trace um caminho que, através da extração, processamento e reciclagem, cumprindo o desígnio de uma economia circular e não verticalizada, assegure o acesso às matérias-primas críticas necessárias para cumprir os seus objetivos climáticos para 2030 e 2050;
  • Em maio, com a celebração do segundo ano do Plano REPowerEU, a Comissão Europeia anunciou que, com o apoio das ações dos cidadãos, das empresas e dos Estados-Membros, conseguiu ultrapassar o seu objetivo de reduzir a procura de gás natural em 15%, tendo esta diminuído 18% entre agosto de 2022 e março de 2024, o que originou uma poupança de cerca de 125 mil milhões de metros cúbicos (bcm) de gás natural[4]. Juntamente com balanço do plano, apresenta também um novo conjunto de peças legislativas com o intuito de acelerar os objetivos inerentes à segurança de abastecimento e à transição energética. Estas peças incluem duas recomendações:
    • Recomendação (UE) 2024/1343 (maio): aponta uma série de recomendações no âmbito da simplificação dos procedimentos de atribuição de licenças para projetos renováveis e dos processos de contratos de aquisição de energia;
    • Recomendação (UE) 2024/1344 (maio): fornece orientações sobre a conceção dos leilões para atribuição de apoio a projetos de energia renovável nos Estados-Membros.
  • Regulamento (UE) 2024/1735 (junho): cria medidas para o reforço do ecossistema europeu de fabrico de produtos de tecnologias neutras em carbono, de forma a promover a melhoria do mercado interno e das cadeias de abastecimento inerentes;
  • Diretivas (UE) 2024/1711 e Regulamento 2024/1747 (junho): introduziram alterações ao desenho de mercado de eletricidade da União Europeia, focando-se na garantia de preços acessíveis e competitivos para consumidores individuais e empresas, no incentivo à transição para  fontes de energia renováveis e na modernização das redes elétricas; ao mesmo tempo, introduzem diretrizes no âmbito da proteção ao consumidor (direito a contratos com preços fixos ou dinâmicos, acesso facilitado a ofertas contratuais e proteções contra alterações unilaterais por fornecedores; bem como a introdução de regras para a partilha de energia e do estabelecimento de comunidades de energia.

 

Já em Portugal, destacam-se as seguintes peças legislativas e marcos de política energética:

  • Decreto-Lei n.º 22/2024 (março), que veio prorrogar, até 31 de dezembro de 2024, a validade das medidas excecionais para a simplificação dos procedimentos de projetos de energia a partir de aproveitamentos renováveis;
  • Ministra do Ambiente e Energia anunciou o leilão para compra centralizada de gases renováveis, com um orçamento anual de 14 milhões de euros ao ano no horizonte temporal de 10 anos (140 milhões de euros de investimento total), cujo objetivo é incentivar projetos no âmbito do hidrogénio verde e biometano, tendo como meta a contratualização (Portaria n.º 15/2023, de 4 de janeiro) de 150 GWh/ano e 120 GWh/ano de biometano e hidrogénio verde;
  • Atualização do Plano Nacional de Energia e Clima 2030 (PNEC 20230) a 1 de outubro, que ratificou muitas das metas anteriormente apresentadas e reforçou com um conjunto de novas metas bastante ambiciosas:
    • A meta de redução de emissões de GEE foi elevada para 55% até 2030 (em comparação com os níveis de 2005), o que representa o limite superior do intervalo anteriormente previsto (45%-55%); O objetivo para a quota de renováveis no consumo final bruto de energia foi ajustado para 51% até 2030, acima dos 47% anteriormente previstos. Este aumento sinaliza a confiança no potencial de atração de investimento proveniente do sector privado associado às energias renováveis;
    • Capacidade instalada renovável até 2030: de 27,4 GW previstos inicialmente para 43,2 GW:
      • Solar: Revisão de 9,0 GW para 20,8 GW;
      • Eólico onshore: Revisão de 9,0 GW para 10,4 GW, com foco no reequipamento de centrais existentes;
      • Eólico offshore: Revisão de 0,03 GW para 2 GW, evidenciando uma aposta estratégica nesta tecnologia emergente;
    • Definição de nova meta para o armazenamento em baterias de 2 GW até 2030.
  • Criação da EMER – Estrutura de Missão para o Licenciamento de Projetos de Energias Renováveis 2030, que pretende assegurar um regime processual mais transparente, ágil e simplificado, de forma a estimular o desenvolvimento do setor renovável;
  • Decreto-Lei n.º 99/2024, que vem transpor parcialmente a Diretiva das Energias Renováveis (RED III), introduzindo inovações no âmbito da simplificação do licenciamento de projetos renováveis, promoção do autoconsumo e comunidades energéticas, revisão de cauções e compensações aos municípios, ajustes no regime de cliente eletrointensivo e melhorias na transparência da contratação bilateral de energia, adaptando o quadro legislativo para apoiar a transição energética e re-industrialização verde;
  • Despacho n.º 15185-C/2024, que aprova o Regulamento para a Atribuição da Compensação aos Municípios;
  • Decreto-Lei n.º 116/2024, que prorroga as medidas excecionais de simplificação dos procedimentos de produção de energia a partir de fontes renováveis previstas no Decreto-Lei n.º 30-A/2022 e no Decreto-Lei n.º 72/2022, até 31 de dezembro de 2026; 

 

 

Quais os maiores desafios e oportunidades?

No ano em revista, o setor energético renovável europeu alcançou progressos significativos. Não obstante, enfrentou também sérios constrangimentos ao seu desenvolvimento, sendo um destes uma volatilidade de amplitude significativa dos preços da eletricidade, com o mercado ibérico a não ser exceção.

A transição para fontes de energia renovável, que ainda carece de uma adequação do desenho de mercado prevista na revisão da diretiva, tem demonstrado as fragilidades do desenho de mercado diário e intradiário de energia, com cada vez mais exposição a preços nulos e negativos e, enquanto noutras horas verificam-se picos de preço acentuados, principalmente nas horas que o mercado fecha com as centrais de ciclo combinado a gás natural. Sem uma rápida resposta regulatória e perspetivando o crescimento do setor em geral, antevê-se um agravamento desta situação em 2025.      

Por outro lado, a taxa de eletrificação dos consumos de energia da economia europeia permanece estagnada em cerca de 23% nos últimos anos. Não ocorrer um aumento da eletrificação dos consumos de energia representa um grave obstáculo para a descarbonização dos setores industriais. Atores como a volatilidade da componente de energia nos preços da eletricidade e a ainda elevada dependência de cadeias de abastecimento globais afetam o setor industrial europeu, ao qual acresce a concorrência com economias do resto mundo, em especial a China e os Estados Unidos da América.

Já o mercado ibérico tem sido palco de procura por parte da indústria verde, atraída pelos preços baixos de eletricidade, elevada conectividade de fibra e terrenos disponíveis, assiste a uma elevada procura de indústria verde de capacidade operacional, prevendo-se um potencial de aumento de procura significativo, espelhado no PNEC 2030 nacional. O consumo industrial cresceu 3% entre janeiro e outubro de 2024, invertendo parcialmente a queda verificada desde 2008. À medida que as energias renováveis baixam os preços de eletricidade ibéricos, prevê-se que a procura industrial aumente 1,9% em termos homólogos até 2060 devido a um aumento da produção das indústrias atuais, de novas indústrias em desenvolvimento na Península Ibérica e eletrificação dos processos industriais.

A transposição da RED III e a Reforma do Mercado de Eletricidade, já legislada através de Regulamento Europeu, faz antever um quadro legislativo favorável e adaptado às necessidades por forma a se concretizarem os objetivos da descarbonização. Conjuntamente com o crescimento esperado da procura de eletricidade na Península ibérica, irá ajudar a mitigar a canibalização dos preços e a integração de energias renováveis no curto e médio prazo.

Prevê-se que a revisão dos Planos de Desenvolvimento e Investimento de Rede de Transporte e Distribuição de eletricidade devam antecipar os investimentos para dar resposta às metas de eletricidade renovável estabelecidas no PNEC 2030, apresentado soluções para modernizar e expandir as redes elétricas, bem como de desenvolver soluções de flexibilidade.

RECOMENDADO PELOS LEITORES

NEWSLETTER

Receba todas as novidades na sua caixa de correio!

O nosso website usa cookies para garantir uma melhor experiência de utilização.