Independentemente do lado que tomam na polémica, ninguém pode negar que a Uber tem uma história complicada com as cidades. Onde se estenderem os seus serviços seguem-se conflitos sobre qualquer regulação que possa afetar as suas actividades—e a partilha de dados não é excepção. No seu mais recente litígio, a Uber recusou partilhar dados sobre os seus movimentos com o governo de Nova York para prevenção de condução perigosa, turnos irresponsavelmente longos e recolha ilegal de passageiros nos aeroportos. Irónico, considerando que até ao seu abuso levar a um processo legal (que custou à empresa uns meros 20 mil dólares) grande parte dos colaboradores da Uber tinha acesso ilimitado a estes mesmos dados, incluindo informação relativa aos clientes.
Agora, a Uber parece estar a fazer uma oferta diplomática, com o lançamento de uma nova plataforma que poderia ajudar as cidades a gerir os seu tráfego. Chama-se Uber Movement, e usa informação sobre os milhares de milhões de viagens realizadas pela empresa para determinar o tempo médio de viajem entre dois pontos a determinada hora do dia. É gratuita, e aberta a todos—ao contrário de outros serviços desta natureza, de acesso exclusivo a agências de planeamento e investigadores.
Desenvolvida por uma equipa de cerca de 10 engenheiros ao longo dos últimos 9 meses, a Uber Movement oferece informação relativa a Manila, Sydney, e Washington DC—e dezenas de outras cidades quando for aberta ao público em meados de fevereiro, e eventualmente qualquer cidade onde a Uber esteja a gerar dados desde o início de 2016. Áreas onde a empresa não realize viagens suficientes para gerar dados confiáveis e anónimos são excluídas.
“Nós não gerimos as ruas, não planeamos as infraestruturas,” explica Andrew Salzberg, Head of Transportation Policy and Research da Uber. “Que sentido faz termos esta informação contida, quando pode ser de tão grande valor para as cidades em que operamos?”
É verdade que as municipalidades geralmente não têm os recursos para obter esta informação. Sensores físicos são dispendiosos, veículos-sonda não podem estar em todo o lado ao mesmo tempo e dados da Inrix, que provêm de veículos comerciais, tendem a limitar-se às maiores artérias. E se tivessem todos os números, poderiam ser capazes de determinar gargalos e zonas onde o transito é particularmente difícil, e detetar picos em tempos de viajem devido a falta de infraestruturas ou outros problemas.
“Para lá disto, não estou certo que seja assim tão inovador,” afirma Kevin Heaslip, planeador de transportes na Virginia Tech.
O que os planeadores verdadeiramente precisam, segundo Heaslip, é onde as pessoas começam e acabam as suas viagens. Compreender os padrões de comutação permite determinar com muito maior precisão onde focar os recursos, seja na melhoria das vias ou na expansão dos transportes públicos. Ainda assim, a ubiquidade dos dados da Uber seria “incrivelmente útil”, concede Heaslip.
A Uber não é a única empresa a partilhar os dados gerados pelos seus serviços, nem a primeira. A app Waze, através do seu programa “Connected Citizens”, trabalha com cidades em todo o mundo, trocando informação útil de tráfego por notificações em avanço ou em tempo real de obras e fecho de estradas para os seus mapas. A app de ciclismo Strava opera de forma semelhante.
Estas fazem parte de uma tendência crescente de companhias privadas aliarem os seus enormes volumes de dados aos poderes regulamentares das entidades públicas. A Uber pode não ter medo de lutar, mas o negócio torna-se mais fácil quando as autoridades locais gostam de ter a companhia na cidade.
Salzberg garante estar a ponderar adicionar mais funcionalidade à Movement à medida que o projeto avança. Ainda assim, considerando a vantagem comercial em manter privados dados desta importância, é pouco provável que Uber ofereça a Nova York—ou a quem quer que seja—a informação que realmente querem. |