Quando terminarmos este ano, Portugal terá a seu dispor “o melhor e mais atual software e hardware disponíveis", o que irá permitir integrar todas as tecnologias de analítica, broadband voice, VoLTE, que vão possibilitar uma tomada de decisões mais rápida e inteligente em termos de segurança pública
A segurança pública é, naturalmente, importante. Com cada vez mais ameaças, é a correta utilização dos dispositivos que auxiliam na segurança que permite que os cidadãos estejam, de facto, seguros. A Motorola Solutions é uma das empresas que tem vindo a trabalhar na área da segurança pública. Ao longo dos tempos, são várias as inovações que a empresa norte-americana tem trazido para o mercado. Em conversa com a Smart Planet, Andrew Sinclair, Corporate Vice President and General Manager for the Software Business da Motorola Solutions, e Juan Manuel Rodrigues, Director & General Manager da Motorola Solutions Portugal, explicaram quais as principais tendências em termos de segurança pública e o que é que os cidadãos, incluíndo os portugueses, podem esperar neste campo. O que é que a Motorola Solutions tem vindo a fazer em termos de segurança pública? Andrew Sinclair (AS) - A Motorola Solutions é uma empresa de segurança pública há 90 anos, líder de land mobile radio em segurança pública. Praticamente todos os agentes da polícia, bombeiros, equipas de emergência, utilizam rádios Motorola. |
Da mesma forma que vimos PBX on-premises passar para a cloud, para Voice over IP, e da voz para video messaging, etc, estamos a ver o mesmo a acontecer na segurança pública. O resto do portfólio pelo qual sou responsável trata de olhar para o workflow que acontece em segurança pública, tudo desde citizen engagement até chamadas de emergência, mobilização, arquivo, gestão, analítica, etc. O 'Santo Graal' aqui é conseguir levar a segurança pública da simples resposta para a previsão e prevenção de incidentes. |
Andrew Sinclair, Corporate Vice President and General Manager for the Software Business da Motorola Solutions |
Quais são as atuais tendências para a segurança pública? AS - Em primeiro lugar estamos a ver muita consolidação em torna deste workflow. Da mesma forma que no espaço empresarial se verificou consolidação em torno do Adobe Creative e do Microsoft Office 365, o mesmo está a acontecer aqui – em vez de adquirir software para aplicações individuais, as pessoas estão a começar a adquirir suites. Estamos a ver tudo isto a ser movido para a cloud, em grande parte pelas mesmas razões: maior facilidade de implementação, atualizações contínuas, melhor cibersegurança, maior fiabilidade. Mas também porque nos dá acesso a uma grande variedade de tecnologias – o vídeo tem explodido nos últimos anos em segurança pública: body-worn video, leitura de matrículas, câmaras estáticas, etc. Não dá para processar video on-premises; ninguém quer pagar pelo armazenamento e computação necessários. O vídeo não se limita à gravação – aliás, o pior que se pode fazer é simplesmente ter uma pessoa sentada a olhar para uma câmara de vídeo. O que é preciso é smart video, que mostra aos profissionais de segurança pública o que é de facto relevante ver. Assim, se alguém entrou num perímetro reservado, o sistema de CCTV tem de dar alerta. Se estivermos a tentar encontrar um carro que esteve envolvido num acidente e fugiu, podemos dizer aos agentes da polícia para o procurarem, mas é muito mais eficiente serem as câmaras a fazê-lo. Depois há o processamento de tudo isto. Uma coisa muito banal que as pessoas tendem a esquecer quando implementam body-worn video é que as imagens têm de ser editadas: se aparecerem pessoas na gravação que não estiveram envolvidas no crime, as suas caras tem de ser censuradas. Já assistimos a muitas implementações nas quais, posteriormente, as empresas tiveram de contratar equipas para fazerem isto manualmente frame a frame. É aqui que a machine vision entra em jogo. Temos agora tecnologias que nos permitem olhar para uma gravação e estabelecer que pessoas não estiveram envolvidas para que o software apague ou censure as caras e matrículas automaticamente. Em suma, como aconteceu no empresarial, estamos a ver uma tendência para adotar tecnologias que incluem vídeo, broadband voice, machine learning e IA para optimizar as operações e melhorar a eficiência dos profissionais de segurança pública.
Estas tendências estão a ser verificadas em Portugal? Juan Manuel Rodrigues (JMR) - Em dezembro de 2016 assinámos um contrato com o Ministério da Administração Interna para fazer a atualização da atual rede de segurança pública portuguesa, que começámos em 2018. Quando terminarmos este ano, vamos ter o melhor e mais atual software e hardware disponível, o que está a abrir a possibilidade de integrar todas estas tecnologias de analítica, broadband voice, VoLTE, etc., que podem ser integradas em novas salas de controlo para possibilitar aos operadores da rede uma tomada de decisões mais rápida e inteligente.
"Quando a polícia está a tentar encontrar um carro roubado ou envolvido num crime, vão lançar um alerta para os agentes procurarem o carro. É muito mais fácil fazer isto com câmaras" |
Juan Manuel Rodrigues, Director & General Manager da Motorola Solutions Portugal |
Quando é que vai estar disponível para o governo? JMR - Até ao final do ano o nosso sistema estará disponível para adaptar e integrar todas estas tecnologias. É importante realçar que não existem tecnologias que possam substituir o Voice over Tetra. A aplicação mission-critical por excelência é a voz – quando um bombeiro ou agente da polícia precisa de ajuda usa um canal de voz. A única tecnologia que oferece isto em aplicações mission critical é o Tetra - ou o B25 nos EUA. O que nós vemos como futuro é a integração destas tecnologias, permitindo que o sistema ofereça uma experiência unificada para o operador integrando a analítica, vídeo e voz no mesmo sistema. |
Há cada vez mais dispositivos IoT em todo o mundo. Como é que isto está a ajudar os cidadãos e como é que está a melhorar a segurança pública? AS - O IoT é uma área muito interessante para nós e temos visto uma implementação muito rápida das nossas tecnologias. Temos por exemplo uma solução chamada 'Aware', que faz a integração de IoT e vídeo num centro de controlo. Um caso que pode vir a ser transposto para Portugal é a implementação recente que fizemos em Nova Orleães. Implementámos o 'Aware' e criámos um centro de controlo em tempo real, fizemos a integração de vídeo e finalmente fizemos a integração IoT, que consistiu na instalação de sensores nos diques que impedem que a cidade seja inundada. A integração de vídeo com o 'Aware' permite que estejam sempre de olhos na situação e a adição do IoT faz com que possam deteta incidentes sem envolver agentes – coisas como inundações, fogos, danos infraestruturais, falhas de energia – e fornecer esta informação ao centro de controlo em tempo real para obter um nível de perceção situacional que permita às equipas de emergência chegar ao local o mais rápido e com o máximo de informação possível. Não faz sentido enviar um agente da polícia a uma inundação, por exemplo, e convém que os bombeiros saibam com que tipo de fogo estão a lidar, se é um incêndio químico, por exemplo. Estamos a ver esta integração de IoT a ganhar tração, particularmente na Europa, com uma série de projetos a acontecer, para descobrir a que limites podemos levar a IoT para detetar estas coisas. Uma vez tendo um a rede de sensores instalada – continuando a usar o exemplo de Nova Orleães – é possível começar a fazer previsões. Tipicamente, falhas nas redes de água têm um efeito bola de neve, pelo que se um dique falhar é preciso prever as repercussões no resto da cidade. É possível começar a construir modelos preditivo em torno disto para, em vez de simplesmente responder ao incidente que está a decorrer, começar também a responder ao incidente que sabemos que se segue.
Disse que já haviam alguns sistemas na Europa. Pode especificar? AS - Há alguns projetos a serem implementados pela União Europeia em termos de deteção de incêndios e vagas de calor, em sítios como Espanha e a Grécia. A UE está a testar várias aplicações do género com diversas companhias e a Motorola está a envolvida em alguns desses projetos porque acreditamos que têm muito potencial. Há muito que pode ser feito para estar sempre um passo à frente de situações potencialmente perigosas.
Pode especificar como é que a IA e machine vision estão a ser aplicadas em segurança pública? AS - Temos uma série de tecnologias a ser aplicadas. Edge computing, por exemplo, permite-nos levar a IA à própria câmara para fazer deteção de intrusos e deteção de anomalias. Assim, se tivermos uma câmara apontada a uma área onde normalmente não há grande tráfego pedestre e nela aparecer uma multidão, a câmara regista a anomalia. Tudo isto requer tecnologias como machine learning e machine vision bastante avançadas. É também possível fazer deteção de pessoas e appearance search, por exemplo para encontrar uma criança perdida num centro comercial. Outra aplicação é o reconhecimento de matrículas. Dando um exemplo simples, quando a polícia está a tentar encontrar um carro roubado ou envolvido num crime, vão lançar um alerta para os agentes procurarem o carro. É muito mais fácil fazer isto com câmaras; tendo em conta o índice de captura de uma câmara podemos muito rapidamente determinar a localização da câmara e apreender o culpado. Por outro lado, se um carro transposer uma fronteira com muita frequência, a analítica pode determinar a possibilidade de se tratar de tráfico humano, caso se encontre numa rota conhecida de tráfico humano. Se determinado carro associado a um criminoso se encontrar com frequência junto a outro carro, é provavelmente um associado conhecido. Podemos portanto pegar nas capacidades das câmaras e de machine vision, combiná-las com modelos preditivos para gerar uma hipótese do que está de facto a acontecer e partir daí para investigar a situação.
"A Avigilon tem uma boa presença em Portugal. Já temos alguns contratos com o Ministério da Administração Interna; inicialmente não havia inteligência artificial envolvida, mas já estamos a começar a abordar essa área"
Isto já está a ser aplicado? AS - Todas as tecnologias que descrevi relacionadas com deteção de intrusão, deteção de anomalias, e deteção de indivíduos são implementadas globalmente através dos nossos produtos Avigilon, maioritariamente nos Estados Unidos mas também em muitos aeroportos e estádios em todo o mundo. A deteção de matrículas é muito usada nos Estados Unidos, mas começa a espalhar-se para outros países, principalmente a Austrália, apesar de ainda não ter chegado a Portugal. Todas estas tecnologias estão disponíveis de momento. Claro que os modelos construídos a partir das mesmas dependem das circunstâncias, do ambiente em que estão, do tipo de crime com que lidam, da cidade, etc.
Como é que a IA pode ser utilizada para melhorar a segurança nas cidades? Qual é o próximo passo na IA? AS - Uma das áreas em que estamos a trabalhar é o que chamamos 'Virtual Partner'. A melhor forma de descrever o 'Virtual Partner' é como sendo a Alexa da segurança pública. Muita da comunicação feita entre os profissionais de segurança pública e o centro de controlo são simples trocas de informação – investigar uma matrícula, pedir reforços, ou pequenas coisas como mudar de canal de comunicação – que não requerem um humano do outro lado. Para facilitar isto, estamos a incorporar tecnologia no 'Virtual Partner' que permite, por exemplo, que um agente da polícia peça para investigar a matricula de um carro e a IA responda não só com a marca e modelo do carro como também o proprietário e, eventualmente, incidentes anteriores aos quais esteja associado. Isto é importante porque, ao mandar encostar um carro, o agente não tem qualquer informação para além do facto que o condutor cometeu uma infração de tráfego. Não sabe se a pessoa por detrás do volante é um criminoso violento e o 'Virtual Partner' pode dizer-lhe isso antes que entre numa situação potencialmente perigosa.
O que é que a Motorola tem em Portugal na área de IA aplicada à segurança pública? JMR - A Avigilon tem uma boa presença em Portugal – a sede europeia está em Lisboa. Já temos alguns contratos com o Ministério da Administração Interna; inicialmente não havia inteligência artificial envolvida, mas já estamos a começar a abordar essa área. Todas a câmaras que temos em todo o país podem ser integradas no nosso sistema e nas nossas soluções de control room para oferecer uma experiência unificada ao operador. O nosso principal problema agora é a proteção de dados, mas para além disso o sistema está preparado.
A legislação vigente de proteção de dados permite estas aplicações? JMR - Ainda não é possível, é uma das restrições com que nos deparamos. Sabemos que vão haver algumas modificações à legislação europeia: devido ao terrorismo, aos ataques que temos sofrido, estão a ser consideradas modificações e sabemos que vêm em breve.
Em suma, o que a Motorola está a implementar em Portugal vai permitir fazer estas coisas, mas a legislação não as permite fazer de momento. JMR - Estamos a implementar a core network que permite fazer isto. Quanto aos centros de controlo, essa é uma decisão que o Governo tem de tomar. Estamos só a possibilitar que a rede venha a integrar estas tecnologias. Como e quando vão ser implementadas tem de ser o Governo a decidir. |